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ENGOMADEIRA

Quem vê Engomadeira hoje, povoada e urbanizada desordenadamente, não imagina que ali, até meados do século passado, existiam fazendas de coronéis e chácaras onde as pessoas cultivavam agricultura de subsistência e preservavam fontes e nascentes utilizadas nas tarefas domésticas, no lazer e nos ritos às divindades afro-brasileiras.
Contam seus moradores mais antigos que a ação feminina foi decisiva na formação do bairro. Foi justamente a atividade mais praticada pelas mulheres, famosas lavadeiras e engomadeiras das roupas dos quartéis das forças armadas, que rendeu ao lugar o nome de Engomadeira. Um destes testemunhos é o de Helenita Lima Ferreira, 61 anos e moradora do bairro há mais de 30, conhecida como D. Nita: “Eu ouvi falar nesta história, que a Engomadeira tem nome de Engomadeira por que tem muita lavadeira. (...) eu sou lavadeira e engomadeira profissional”.
D.Nita emprestou também sua fibra e suor aos serviços domésticos nos conjuntos habitacionais construídos nas imediações do bairro. Situação que levou um grupo de mães a fundar, em 1985, uma das entidades mais antigas e representativas da comunidade, o Conselho de Moradores do Bairro da Engomadeira (Comobe), que tem à sua frente uma mulher negra, professora e mãe de três filhos, Antonieta da Conceição Souza Santos, a D. Antonieta, moradora do bairro há 32 anos: “Criamos a escolinha porque as mães iam trabalhar e não tinham com quem deixar os meninos”, explica.
Hoje, os filhos das engomadeiras e empregadas domésticas são professores, radialistas, universitários e ativistas sociais que estão à frente de muitas das organizações da comunidade. As pesquisas desenvolvidas por essa nova geração já sugerem uma nova explicação para o nome do bairro, que teria origem na palavra de origem bantu “ngoma”, que significa “tambor” no candomblé de Angola.

Fonte: Cultura no ponto/Fundação Gregório de Matos. V.1, Salvador: FGM, 2006

 

 
Área
MIOLO CENTRAL
 
Depoimentos
“Havia muitas nascentes. Cada fonte recebia o nome da pessoa que cuidava dela. Aí nós tínhamos a nascente de Nanã preservada pelo pessoal do Terreiro de Nanã, a de Seu Pompílio e a de Seu Peixoto. Todas acabaram. O pessoal não conservou. O rio que separa Engomadeira do Beiru (Tancredo Neves), que hoje é um esgoto, era limpo e as águas tranqüilas. Ainda temos um lajedo (queda d´água com pedras lapidadas pelo rio)”.
D. Antonieta, presidente do Comobe

“Quando nós viemos para cá não era assim. Pelo menos não tinha essa rua que tem aqui hoje, a rua era barro puro (...) Os moradores velhos, pelo menos, algumas pessoas respeitam”.
Pedro Gomes da Conceição, morador da Engomadeira há 24 anos

“Meu nome é João Adorno Araújo, tenho 73 anos e moro aqui há 35. Eu construí essa casa depois de muito tempo. Esse nome João do Porco é porque eu matava porco e vendia aí em frente. Quando eu cheguei não tinha carro direto para cá. Não tinha água, nem rede de esgoto (...) Hoje eu vendo ervas, pratos de barro, louça, moringa”.
João Adorno Araújo, comerciante local conhecido como Seu João do Porco

"À boca da noite eu me sentava na porta, cantando e batendo tambor e os meninos brincando por aí, eu me entretia até tarde da noite. Eu cantava, mas hoje em dia não dá mais por causa do derrame”.
Gervásio Rodrigues dos Santos, o famoso Seu Nem, de 86 anos, ex-bóia-fria, tocador de engoma e mestre do Samba de Chula

“Eu cantava músicas do tempo que morava no interior, em Amargosa, que tinha aquelas festanças e se brincava a noite toda! Ele (Seu Nem) aprendeu (... ) Esse asfalto tem só uns três anos. Era tudo lama isso aqui. Eu lavava muita roupa para fora. Depois não agüentei mais”.
Amália de Jesus Santos (a D. Amália) 81, ex-bóia-fria e lavadeira, mãe de 12 filhos e esposa de Seu Nem

Fonte: Cultura no ponto/Fundação Gregório de Matos. V.1, Salvador: FGM, 2006
 
Atrativos
CONSELHO DE MORADORES DO BAIRRO DA ENGOMADEIRA (COMOBE)
Uma das principais referências de mobilização da comunidade, o Conselho de Moradores de Engomadeira (Comobe) nasceu em 1985, dentro da Igreja Católica Ascensão do Senhor, na época do padre Maurício, que está atualmente na paróquia de São Gonçalo. O Comobe foi criado por um grupo de mães que perceberam a necessidade do desenvolvimento de trabalhos de assistência social voltados para a população local.

TERREIRO KAFUNJI ODÉ L´FUNJI
O Kafunji Odé L´Funji, da nação Ketu, tem à frente o Pai Luís de Oxossi ou Pai Luís de Obaluaiê. Além da orientação espiritual, o terreiro realiza muitas festas abertas à comunidade. No mês de abril acontece festa para Oxóssi. No último domingo de agosto, é a vez da procissão em louvor a Obaluaiê e na terceira semana de setembro acontece a festa do Caboclo Serra Negra.

COOPERATIVA MÚLTIPLAS FONTES DE ENGOMADEIRA (COOFE)
Fundada há seis anos, a Cooperativa Múltiplas Fontes de Engomadeira (Coofe) é fruto da parceria de um grupo de mães do bairro com a Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), campus do Cabula, através do projeto Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares. Quando seus 11 conselheiros e conselheiras ainda buscavam uma alternativa de negócio viável, capaz de gerar emprego e renda para suas famílias, não imaginavam que se tornariam um dos maiores vendedores de pães, doces e salgados da comunidade. E o melhor: já aceitam encomendas.

RÁDIO HITS MODULADA COMUNITÁRIA
A Rádio Hits tem um papel significativo na sua área de abrangência, que compreende o bairro de Engomadeira, a Estrada de Barreiras, o Conjunto Habitacional OPM II, o Recanto do Cabula e a Uneb, e atinge diversas camadas sociais.

TERREIRO VIVA DEUS FILHO
Localizado no fim de linha de Engomadeira, o Terreiro Viva Deus Filho, da nação Angola, tem à frente da casa Antonia Ferreira de Almeida, a Mãe Antônia. O terreiro tem um animado calendário de festas abertas para a comunidade durante todo o ano. Em junho, acontece a feijoada para Ogum e a festa dos Caboclos. No último domingo de agosto, o homenageado é Kicongo, o Velho. Em setembro, é a vez da festa dos Erês e, no primeiro domingo de dezembro, acontece a festa para Yemanjá.

CATÁLOGO CULTURAL

ARTEBAGAÇO ODEART
Coordenado por Janice Nicolin, Diego Nicolin e Benivalda Moraes, o grupo Artebagaço é composto por uma maioria de jovens negros que reside na Engomadeira, mas que, por falta de espaço, se reúne na Escola Estadual Roberto Santos (Cabula) e na Associação de Moradores da Estrada das Barreiras.
“Comunidade, por sua vez, não é o espaço utópico de trocas beatíficas, isenta de conflito e luta. É, antes, o lugar histórico possível em que a tradição se instala como uma dimensão maior que a do indivíduo singular, levando-o a reconhecer-se nela como algo diferente de si mesmo, como um grande outro que inclui tanto pedras, plantas, animais e homens, como a própria morte, com a qual se institui uma troca simbólica na forma de culto aos ancestrais”.
Muniz Sodré
Arte & Bagaço nasce de uma compreensão crítica que tivemos do modo unilateral como a escola interpreta, esquadrinha, disseca o nosso modo de ser e de viver sociocomunitário comunal, como bagaços, mas ao longo dos tempos percebemos que a engrenagem escola, por se incumbir apenas de garantir a cópia do que propõem o livro didático e os mecanismos pedagógicos de controle do saber gerados pela maquina social moderna neocolonial urbano-industrial, não conseguia e não consegue entender o que dizíamos.
Este fato favoreceu-nos a percepção de que a escola não apenas nega, mas oculta, sim, oculta para não revelar sua incapacidade de ler os complexos códigos pluriculturais comunitários presentes no seu cotidiano, já que esta desenvolve apenas a visão unilateral dos eventos e não consegue, se quer, fazer esta pergunta a si mesma: como transcender as barreiras emergenciadas?
A metáfora Artebagaço é a justaposição que se diz de si mesmo retrucando, com um sentido satírico e irônico, o pensamento conceitual subjugador e oferecendo a “inversão carnavalesca” de Bakhtin (1995) pois o riso, o jogo de corpo, o olhar são metamórficas contradições da vida cotidiana, isto é arte, é o poder de expressar esta filosofia de vida.


ASSOCIAÇÃO DE CAPOEIRA DEFESA E ATAQUE NOVA GERAÇÃO
A Associação de Capoeira Defesa e Ataque Nova Geração foi fundada em 15 de novembro do ano de 2000 pelo professor Rubem Gelson Miranda da Paz, mais conhecido como Mestre Azulão. Por cultivá-la desde criança, Mestre Azulão se dedica plenamente à capoeira com muito amor e prazer. Recentemente, criou a bandeira do grupo, com o escudo que é levado na camisa e um hino que traz mensagens de união e paz para todos os capoeiristas.

GRUPO DE CAPOEIRA ANGOLA CABULA (GCAC)
Os trabalhos do GCAC envolvem o ensino da prática da Capoeira Angola para crianças de comunidades carentes e a preservação da cultura dos antepassados aos jovens e crianças pelo Mestre Barba Branca, discípulo mais velho do Mestre João Pequeno de Pastinha. Atualmente, as aulas são dadas no Terreiro de São Roque (Beiru), na Escola Deputado Gersino Coelho (Narandiba) e no Comobe (Engomadeira).
Além da prática da Capoeira Angola - que envolve movimentos de corpo, toques de berimbau, confecção de instrumentos e ensino de cânticos antigos - são promovidas palestras e debates que visam envolver também os pais das crianças sobre temas da atualidade e da cultura negra.
O ensino da Capoeira Angola permite o resgate da auto-estima de crianças afro-descendentes em situação de vulnerabilidade social, através do reconhecimento da história de seu povo contada por seus antepassados, contribuindo assim para o combate à violência na periferia de Salvador. A área do Cabula, território remanescente de quilombo, detém um patrimônio vivo, uma potencialidade reproduzida nas suas diversas manifestações culturais, cujo trunfo principal é a preservação da cultura dos antepassados articulada em rede com associações de outros bairros e terreiros de Candomblé.

BLOCO AFRO ARCA DO AXÉ
Tel.: 8153-5527
Mantido pela Escola Comunitária Engenho dos Negros, o bloco afro Arca do Axé desenvolve atividades de percussão, dança afro, artesanato, produção de adereços, fantasias, máscaras, estética afro, informática, teatro, alfabetização de jovens e adultos, biblioteca e banco de informações nagô.

VÍDEO PRODUTORA DA ENGOMADEIRA (VIPE)
Nascida há três anos de uma oficina de vídeo promovida por alunos da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), campus do Cabula, a Vídeo Produtora de Engomadeira (Vipe) é um empreendimento de alguns alunos do grupo de teatro amador da Escola Comunitária Engenho dos Negros. Eles começaram filmando a peça que apresentavam, “No Brasil tudo é 10”, e hoje realizam serviços de filmagem em geral e criação de roteiros. Seus quatro integrantes são: Edlo Filho, Jaqueson Dias, Luís Eduardo Moreira e Roberto Moreira.

Fonte: Cultura no ponto/Fundação Gregório de Matos. V.1, Salvador: FGM, 2006
 
 
 
 
Personagens
D. ANTONIETA
Natural do município de Livramento de Nossa Senhora, a professora Antonieta da Conceição Souza Santos, 57 anos, já está na Engomadeira há 32: “Quando eu cheguei aqui, já casada, tinha 25 anos. Era totalmente diferente de hoje. A rua principal era uma viela com poucas casas, a maioria feita de barro. Não havia água encanada e poucas casas tinham luz.”
Dona Antonieta foi e ainda é uma das principais articuladoras do Grupo de Mães do bairro, entidade que fundou há 21 anos, o Conselho de Moradores do Bairro da Engomadeira, o Comobe, do qual é presidente pela terceira vez. A entidade, que nasceu na raça e na vontade quando a comunidade ocupou o terreno baldio ao lado do posto de saúde da Rua Direta da Engomadeira, é a vida desta senhora que co-educou e cuidou de boa parte dos jovens da comunidade, seus alunos na escolinha criada pela necessidade das mães que trabalhavam fora e não tinham com quem deixar seus filhos.
Além de professora, D. Antonieta é também artesã (faz bonecas de pano, anjinhos de bucha, caixas de presente, sacolas, cintos etc), ofício que herdou da mãe, D. Alice da Conceição Souza Santos, de 90 anos, que lhe ensinou desde criança, no interior, “a ir no mato buscar uma raiz para fazer enfeite”, explica. Com muito prazer, D. Antonieta passa tudo o que sabe para as mães e idosos da Engomadeira. “O que eu sei, eu quero passar aos outros. Se eu tivesse dinheiro, gastava todo nisso”.

SEU NEM E D. AMÁLIA
Geovásio Rodrigues dos Santos, 86 anos, o Seu Nem, e Amália de Jesus Santos, 81, a D. Amália, ambos ex-bóias-frias e naturais de Ubaíra, estão casados há 60 anos. Mas, além da lição de amor e companheirismo, que gerou 12 filhos, e das plantas medicinais que têm no jardim para socorrer os vizinhos nos momentos de aperto, eles são famosos na comunidade pelo tambor de engoma e o samba de chula que Seu Nem toca há 25 anos na porta de casa. E ninguém melhor para falar de Seu Nem que D. Amália: “Toda a vida Nem foi tambozeiro. Aquilo ia para festa... Trabalhava a semana toda, mas quando era dia de sexta-feira e sábado corria para festa. Eu não tive muita soltura. Meu trabalho era de dia na roça e de noite tomava conta dos filhos. Mas às vezes eu ia...”.
Seu Nem conta que depois da reza e das ladainhas da Igreja, eles tomavam café e só depois começavam o samba de chula: “E não era só um tambor, não! Eram dois, três, quatro e tinha pandeiro também, cada um tirava uma chula. Na hora de sambar, dá aquele sapateado e depois volta pro lugar”.
Quando chegaram em Engomadeira, em 1959, a pedido dos filhos que vieram para a capital, Seu Nem passou a tocar na porta de casa. D. Amália explica que “a festa dele (Seu Nem) era aqui. Juntava mais os filhos e brincava tudo na porta. Era bonita aquela roda de gente batendo tambor. Todo mundo cantando e brincando ali na maior alegria”.
D. Amália fala dessas festas no passado porque hoje em dia Seu Nem já não canta mais. É que há uns seis anos ele teve um princípio de derrame: “Quando eu vou cantar me dá um negócio e eu perco a voz”, explica o mestre. Mesmo assim, durante a conversa, ele pegou o tambor de engoma feito por Seu Pitutinho, carpinteiro e artesão, e puxou uma chula:

SEU PITUTINHO
Marceneiro, carpinteiro, pedreiro, artesão, reformador, dono de bar e preparador de efusões de cachaça. Estas são algumas das profissões de seu Elísio Dias, 64 anos, morador da Engomadeira há aproximadamente 47 e mais conhecido como Seu Pitutinho. O apelido ele recebeu ainda criança no município de Irará, onde nasceu: “Me disseram que quando eu nasci era miudinho e bonitinho e me botaram o nome de Pitutinho”, brinca.
Dentre as suas obras mais admiradas pela comunidade estão o tambor de engoma vendido a Seu Nem, o cavaquinho que achou no lixo e restaurou, e a escultura de preto velho que pôs no bar onde trabalha. A desenvoltura do mestre carpinteiro e preparador de cachaças chega a espantar Elisabete Dias, uma de suas cinco filhas: “Os meninos aqui do bairro já gostam de parar aqui para conversar com ele e olhe que jovem não gosta de conversar com idoso... Ele tem uma coisa para conversa...”.
Seu Pitutinho tem dez filhos, todos com D. Diva dos Santos Dias, e a habilidade para as atividades manuais parece ser uma herança de família. Os ofícios com a madeira ele conta que aprendeu ainda garoto com o pai: “Meu pai era carpinteiro, eu sempre trabalhava com ele e aprendi; o resto é a curiosidade do homem. Eu sei é que no fim das contas até cachimbo de barro eu sei fazer”. Hoje, um de seus filhos, “é ourives de mão cheia”, comenta orgulhoso.
Mas nem tudo foram flores em sua vida: há dez anos, Seu Pitutinho se envolveu de maneira exagerada com o álcool, mas conseguiu se recuperar através do grupo Alcoólicos Anônimos, que funciona na Igreja do Beiru-Tancredo Neves. Apesar disso, continua fazendo sua “importação”: mistura de ervas com cachaça que vende parcimoniosamente no seu bar: “O engraçado é que eu trabalho com cachaça, mas falo contra a cachaça. Se o sujeito toma pouquinho é até um remédio, mas se toma muito acaba fazendo mal”.
De maneira muito divertida, Seu Pitutinho explica a função de cada efusão: “Erva-doce é bom para gases, Bom para tudo dizem que é bom para potência, Cabuim é para não tomar cachaça pura, Jatobá a gente usa lá no interior com limão para a gripe, Cravo é bom para botar gases também, Catuaba é bom para fortalecer o sangue, Milome é bom para a natureza (dor de barriga) e Catuaba Selvagem é fortificante”.
Seu Pitutinho não sabia ler nem escrever: “Naquele tempo meu negócio era trabalhar e fazer menino”. Hoje, na 3a série do primário, ele corre atrás do prejuízo: “Educação não é a leitura, educação vem de berço. Por aí está cheio de médico, de engenheiro que não sabe tratar as pessoas. Hoje tem concurso e passa quem tem a leitura, mas não tem a mente, que é o que desenvolve a profissão”.

MESTRE BARBA BRANCA
Discípulo mais velho do Mestre João Pequeno de Pastinha, Gilberto Reis F. Santos Filho, o Mestre Barba Branca, do Grupo de Capoeira Angola Cabula (GCAC), tem 35 dos seus 50 anos dedicados a este esporte-arte de matriz africana, misto de dança e luta, que começou a praticar ainda adolescente no bairro da Liberdade, com o Mestre Traíra.
Aos 18, Gilberto decidiu passar a treinar com o Mestre João Pequeno, ainda no Pelourinho. Oito anos mais tarde, passou a buscar seus próprios caminhos na capoeira Angola. Tornou-se mestre um ano depois, o que aconteceu de maneira muito engraçada: “João Pequeno não queria me dar o diploma de Mestre. Ele queria que eu fosse o seu contra-mestre e só depois da sua morte, conforme uma das mais antigas tradições da capoeira, é que eu passaria a mestre. Foi Mestre Bobó do Dique que o convenceu e ameaçou: - João Pequeno, se você não der logo o diploma de Mestre a Gilberto, quem vai dar sou eu”.
Para Barba Branca, a capoeira nunca foi um meio de vida. Mecânico industrial aposentado da Petrobrás, nem mesmo o trabalho foi desculpa para que não levasse a sério o esporte que lhe proporcionou “socialização, boas amizades e andar pelos caminhos certos. Não que eu fosse um cara errado, mas me ajudou a me doutrinar”, explica. Atualmente, ele dá aulas no Terreiro de São Roque (Beirú), da nação Angola; na Escola Deputado Gersino Coelho (Narandiba) e na sede do Conselho de Moradores do Bairro de Engomadeira (Comobe). Aliás, a relação de Mestre Barba Branca com o Candomblé é antiga: ele já deu aula por 10 anos no Ilê Axé Opô Afonjá, tem um grande respeito e admiração por Mãe Stela e D. Detinha, mas se considera apenas um simpatizante da religião: “Não sou feito nem nada, sou simpatizante e estudioso. Eles têm uma consideração muito grande por mim porque no Candomblé, se você é puro de coração, eles sempre te respeitam”, diz o mestre.

Fonte: Cultura no ponto/Fundação Gregório de Matos. V.1, Salvador: FGM, 2006
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